domingo, 2 de dezembro de 2018

Like Father, Like Son

O ritual de jogos do Palmeiras é sempre o mesmo: 

Meu pai se esparrama no sofá da sala com sua bacia de pipoca e um copo de Coca-Cola. Segundo minha mãe, o pai nunca foi muito chegado em cerveja ou bebidas alcoólicas. Tudo que sei sobre o meu pai são informações que recebo dos outros e penso com certa frequência que se fôssemos só eu e ele, provavelmente só saberia seu nome (Luiz), seu emprego (pasteleiro) e seu nível de parentesco comigo (pai). Enquanto ele liga a TV para assistir Palmeiras e Vasco, imagino que talvez nem saberia seu time de futebol, não fosse os comentários de meus tios corinthianos nos jantares de família. É importante que se saiba que meu pai é palmeirense numa família de corinthianos e é importante que se saiba que ele quase nunca fala ou demonstra sentimentos. 

Nunca vi meu pai xingar algum jogador ou comemorar um gol. Independente da situação do Palmeiras, ele continua impassível sem esboçar qualquer reação. A imagem do pai com camiseta de time, lata de cerveja na mão e a cara vermelha de tanto gritar (ou beber) é algo distante para mim. 

O jogo começa, mas não tenho muito tempo de prestar atenção nele ou em meu pai. Na verdade estou muito irritada de ter que lidar com o barulho na vizinhança justo no dia em que preciso escrever páginas e mais páginas para o trabalho de Literatura Portuguesa. Agradeço por meu pai não ser o velho que está berrando no bar do outro lado da rua e que observo com atenção - de repente qualquer coisa parece mais interessante do que escrever cinco páginas sobre Almeida Garrett. 

Quando finalmente consigo ultrapassar a barreira das duas primeiras páginas, meu pai muda de canal para um filme natalino. O intervalo de tempo entre a mudança brusca de canal e os gritos de gol e fogos que se seguiram não foi suficiente para que eu pudesse entender a atitude de meu pai. Ele volta para o jogo xingando baixinho enquanto acompanha a reprise do gol da vitória. 

Ao final do jogo meu pai mantém um sorriso de canto de boca raramente visto. 

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A última vez que vi aquele sorriso em meu pai é uma lembrança confusa da primeira infância. Estávamos reunidos na casa da minha avó enquanto Palmeiras e Corinthians jogavam. Meus tios provocavam meu pai de todas as formas possíveis e ele continuava imperturbável, como se não estivesse de fato ali. 

O primeiro gol do Palmeiras fez o silêncio na sala. Meu pai não disse nada, como sempre. Se levantou do sofá e saiu. Minha mãe e minhas tias estavam muito ocupadas na cozinha dando atenção para meu irmãozinho que tinha acabado de nascer e não perceberam quando meu pai atravessou a mesa de jantar para chegar do lado de fora.

Meu pai estava parado no jardim segurando aquele mesmo sorriso. Ficamos por lá até o final do jogo, fingindo que estávamos muito interessados nas flores e plantas da minha avó. Mesmo quando o Corinthians conseguiu finalmente virar o jogo meu pai não abandonou o sorriso. Ele ouviu as piadas e provocações, me pegou pela mão e disse que era hora de voltar para casa. 




segunda-feira, 26 de novembro de 2018

O campeão

Uma vez um amigo meu disse em seu texto sobre as virtudes e defeitos do novo e o antigo esporte bretão. Ali, dissecou em uma, ótima, forma didática. Até ousou em dizer quais são os sonhos para que cheguemos à pós-modernidade do futebol. Um texto que abrangente, sonhador, mas sem esquecer da realidade atual. Aliás, diga-se de passagem, este foi a resenha do companheiro de blog Vitor Brauer, anterior a este que escrevo no momento.

Acredito que, nesta segunda-feira, 26 de novembro, têm histórias mais interessantes para contar. Se você procurar o que aconteceu no mundo da bola neste fim de semana, você encontrará assuntos dos mais diversos, interessantes, polêmicos. Espero que um de nossos colaboradores do blog o façam, tenho certeza de que saíra coisa boa daí. De toda forma, de alguma maneira, eu senti a necessidade de tratar sobre a Sociedade Esportiva Palmeiras e Luiz Felipe Scolari (o Felipão). O clube e treinador recém campeão do Assaí 2018, como diz a CBF. Repetirei este nome, Assaí, algumas vezes durante o texto. É uma piada interna. Assaí, só de falar começo a rir.

Mera foto ilustrativa do campeão do Brasileirão Assaí 2018
E aqui chegamos. Ainda resta mais uma rodada para este Brasileirão terminar. A briga para não ser relegado a segunda divisão está acirrada como de costume. A partir de semana que vem começam-se as especulações sobre contratações, quem entra e quem sai de cada clube. E todo ano discutimos, também, o estado do futebol nacional. É de praxe. Várias análises podem ser feitas e diversos ângulos serão cobertos com minúcias. Neste caso, estou aqui para dar continuidade ao que meu amigo Vitor vinha dizendo em sua breve análise, como ele disse. 

Palmeiras tinha Roger Machado, um técnico que tenta praticar o futebol moderno, o futebol  envolvente, a bola no chão como dizem. Um time que tenha uma movimentação mais fluida no ataque, aquela troca de passes que nos enchem os olhos. Um repertório ofensivo completo. Uma linha defensiva compactada, que pressione e roube a pelota no campo adversário para estar a poucos metros da baliza adversária. Roger tentou aplicar tudo o que sabe e se prega sobre a evolução do futebol. E assim fracassou no comando do time após a décima quinta rodada. O verdão é o time de maior poderio financeiro do país e, por isso, com melhor grupo de jogadores do Assaí. Um dia após a demissão de Machado, Felipão estava lá, iniciando os seus trabalhos. Por mim, seria melhor se ele apenas estivesse iniciando os trabalhos com uma cerveja na mão, diz a moda da internet, suas fotos e  hashtags. Contudo, para o meu desgosto ele estava de volta e comandando mais uma equipe após o vexame do 7x1. 

Muita coisa aconteceu após aquele placar inesquecível. Poderia citar, porém me perdoe, a preguiça falou mais alto. Estou aqui sentado em minha folga do trabalho e tudo o que quero é não ter de adentrar em uma pesquisa, abrir 5, 10 abas da minha ferramenta de navegação. E se tenho que te dizer uma coisa, é que o futebol não mudou. Pelo menos é a impressão que passa. Palmeiras não estava lá tão errado em trocar de técnico naquela altura, naquela hora o esquadrão verde não estava bem como o futebol moderno pede. Definitivamente a entrada de Scolari foi uma surpresa a todos. 

E lá ele foi, com seu jeito de comando. Em uma recém matéria publicada na Folha de São Paulo, Luiz Felipe Scolari disse que impôs ordem ao Palmeiras. Disse, também, que deu uma cobrança um pouco mais incisiva, deixou claro que estava ali para ser campeão e que, para isso, precisava que cada um cumprisse ordens. Fale por você, mas eu fiquei completamente assustado quando li. Olhando com calma e mais distante, não esperaria menos. Ele sempre foi assim, essa figura impositiva. Não atoa ele tem esta alcunha, Felipão, um macho-alfa, o patriarca. Talvez você se lembre na Copa do Mundo de 2002 quando existiu a "Família Scolari". Uma ordem deve estabelecida afinal de contas.

Felipão cala seus críticos após mais uma conquista
Em todos seus clubes que passou ele prezou por uma defesa sólida e uma forma de atacar nada fluida, nada criativa e dependente dos brilhos individuais de seus jogadores. O Palmeiras foi a equipe que mais rebateu bolas neste campeonato. Deixe-me explicar, sabe aquele chutão que os defensores dão para o ataque para afastar e pela pobre forma de elaborar jogadas, foram 32 vezes por jogo. O clube alviverde, também, foi a equipe que mais tentou lançamentos durante o Assaí 2018, uma média de 43 por partida. Vamos analisar rapidamente, não desanime, fique aqui comigo, eu ficarei muito feliz se você continuar até o final. Cada leitura que uma pessoa dá significa muito para nós do blog e para cada um, individualmente. Estas duas jogadas são as antíteses de toda a evolução que o futebol propõe. Isto se dá porque nestas jogadas a bola é alçada ao ar, a sorte. E, na maioria das vezes, a bola fica para o time adversário. Se você quer ganhar uma partida, logo você deve ter a bola em seus pés. E tê-la pela maior parte do tempo deve garantir na, grande parte, as melhores chances para vencer o certame. Cuidar bem do caroço é aonde o futebol pós-moderno se norteia.

Após a maior e mais humilhante derrota do futebol de todos os tempos, o 7x1, o comandante Felipão minimizou a derrota e suas falhas.Todavia, para a sorte dele, desta vez o elenco era o melhor do país. Para a sorte dele, a bola que rola aqui, também, não mudou. Para a sorte dele, o tão sonhado futebol pós-moderno que o meu caro colega, Brauer, apontou anteriormente, não chegou e assim foi campeão do Assaí 2018. Devo dizer que existem méritos nesta conquista, talvez não consiga enxergar, afinal, sou míope. Mas estão lá. Ele foi campeão, certo? 

Jajaja a discussão sobre o futebol praticado, as resoluções para o ano que está por vir, as promessas de melhora, tudo isso será dito daqui até janeiro. Quiçá até fevereiro e seu carnaval. Aí sim o ano irá começar, e tudo continuará normalmente. Alguns passos para frente e milhares para trás. Parece um ciclo interminável, espero que foquemos nos passos que nos leve adiante. À Sociedade Esportiva Palmeiras, ao Felipão, aos jogadores e seus torcedores, parabéns pela conquista. Posso não gostar e nem concordar, mas o respeito sempre deve vir em primeiro lugar. 

terça-feira, 20 de novembro de 2018

Em Defesa do Futebol Moderno e o Sonho do Futebol Pós-Moderno

Alexandre, o Pires, com sua barbixa mais torta que as concepções sobre futebol

Iniciando os trabalhos de quarta-feira, é necessário dizer que "não estou aqui só pra contrariar", como diria Alexandre Pires, apesar do nome da sua banda. Mas vale a pena se perguntar sobre o status quo das críticas contemporâneas sobre o "futebol moderno" e se elas estão certas ou erradas, se é que existe essa coisa de certo ou errado. Para começar nosso texto jornalístico-investigativo-de-google, é preciso se perguntar: o que é o futebol? Sabemos que essa pergunta soa boba e que devemos escrever na terceira pessoa do plural, mas realmente o que é o futebol? Para algumas pessoas, futebol seria o esporte e apenas ele. Para essas pessoas seguirem uma linha lógica e não entrarem em contradição o futebol é apenas o que ocorre dentro das quatro linhas ou dentro do campo como um todo. Para outras, futebol envolve toda uma gama de elementos, desdos torcedores assistindo na sua tevê, passando por torcidas organizadas, donos de clubes, CBF, FIFA, empresários e árbitros, até o pé do jogador que chuta a bola. Existem outras posições mais cinzas entre uma e outra perspectiva, mas vamos adotar essas duas como principais para tentar analisar o futebol antigo e o moderno. Devemos estabelecer também o que é conhecido por "Futebol Moderno" e o que é conhecido como "Futebol das Antiga", como o forró. Chamaremos de "Futebol Moderno" o futebol à partir do nascimento de Cristiano Ronaldo, o Cricri, pois ele é o maior representante da raça moderna. "Futebol das Antiga" é até o Cricri nascer. Vamos começar estabelecendo o que é positivo e negativo, de forma bem geral porque isso não é um trabalho de conclusão de curso, para cada um dos lados do futebol. Estamos usando como material de estudo o futebol mundial, não só o futebol brasileiro (antes que cheguem as pessoas e falem que aqui no Brasil não é assim e que isso é so lá na Europa, etc).

Pontos positivos do "Futebol das Antiga":

+ o contato entre fãs e clube era mais direto e íntimo
+ ingressos mais baratos
+ os campeonatos eram mais equilibrados e não existia uma diferença econômica tão grande entre times "grandes" e times "pequenos"

Pontos negativos do "Futebol das Antiga":

- o futebol era mal jogado, muito por conta da falta de investimento
- os estádios eram mais perigosos, tanto no nível estrutural quanto no nível de violência (isso mais lá fora que aqui)
- as ligas eram menos estruturadas
- futebol feminino praticamente inexistente
- futebol muito homofóbico e racista

Pontos positivos do "Futebol Moderno":

+ o futebol é jogado melhor, especificamente por conta do investimento
+ ligas são mais estruturadas e desenvolvidas
+ estádios mais seguros
+ futebol feminino recebendo um pouco mais de investimento e popularidade
+ racismo e homofobia estão sendo combatidos cada vez mais

Pontos negativos do "Futebol Moderno":

- clubes tratam torcedores como consumidores
- a diferença dos níveis de investimento deixa os campeonatos muito menos equilibrados
- jogadores não tem paixão pelo time e muitos são conhecidos por serem mercenários à procura de quem dá mais dinheiro
- ingressos caros

Os pontos acima, são de caráter objetivo (apesar de isso ser uma ilusão como sabemos bem), com base em dados e pesquisas em geral. Temos agora finalmente os pontos que eu chamo de "mais ou menos". Estes, diríamos, são de caráter menos claro e por isso subjetivo.

Pontos mais ou menos entre "Futebol das Antiga" e "Futebol Moderno":

+ ou - a globalização fez o futebol e os torcedores ganharem um caráter heterogêneo, isso traz coisas boas e ruins, uma das coisas boas é o fato de existirem torcedores da Juventus ou do Arsenal no meu grupo do Cartola e de você ver um ambulante com uma blusa de um jogador desconhecido do Napoli que ele é fã, ao mesmo tempo essa mesma globalização fez com que os torcedores se transformassem em "mentirosos fingidos" ou "torcedores modinha", torcedores que não torcem realmente para seus times e não os apoiam em momento de necessidade
+ ou - o grande nível de investimento dos clubes fez com que o futebol tomasse um caráter estéril, que pode vir para o bem e para o mal, vantagens disso vemos como o exemplo dos jogadores terem mais preparo físico para longos jogos e carreira mais duradoura, e a infraestrutura geral dos estádios e a transparência (ainda que pouca) do gasto de clubes e contratação de jogadores, como desvantagens vemos os times perderem a fidelidade aos torcedores antigos e sua localidade, como mudar o nome de seu time, mudar o lugar do estádio, até às vezes mudando de cidade por conta de melhor estrutura e mais lucro
+ ou - os grandes avanços tecnológicos tornaram o futebol mais jogado e menos jogado ao mesmo tempo, por um lado vemos grandes vantagens - como na tecnologia da linha do gol - por outro lado vemos uma lambança total no que diz respeito ao VAR, que deveria retirar os erros subjetivos dos juízes e acabou transformando em mais subjetivas do que nunca as decisões dos árbitros
+ ou - os craques antigamente se sobressaíam mais e mais, hoje em dia não se sobressaem pouco, isso pode ser positivo ou negativo, dependem do ponto de vista e muitos até poderiam argumentar que os craques ainda se sobressaem muito hoje em dia

Esses não são os únicos pontos vantajosos e desvantajosos do "Futebol das Antiga" e do "Futebol Moderno" mas essa não é uma monografia, então tentamos ser breves.

Marta ganhando sua quinquagésima Bola de Ouro, ao lado de DJ Big Driis

É possível ver que o "Futebol Moderno" ganha por pouco. Algumas das vantagens, no entanto, não provêm do futebol em si, mas sim de transformações sociais gerais como a defesa dos direitos dos negros, das mulheres e dos homossexuais. O caminho ainda é muito longo nesse quesito, mas estamos andando. Há vinte anos atrás era claro o preconceito, desde apelidos maldosos até o próprio racismo direto em humilhações públicas. Casos iguais ao do infame Torcedores Racistas do Grêmio vs Aranha eram muito comuns e socialmente aceitos antigamente, hoje nem tanto, graças a Deus.

Fora as questões de caráter social (mas na verdade entrando fundo nelas), principais vantagens e desvantagens de como o jogo é jogado hoje em dia vem de mãos dadas ao dinheiro investido. O futebol é o esporte mais popular do mundo e o sistema capitalista não deixa passar uma oportunidade. A ideia de ir contra o "Futebol Moderno" no final das contas é dizer não ao controle das grandes corporações e empresários sobre o esporte. Isso é louvável. No entanto, é bem comum se ver torcedores com uma posição saudosista e nostálgica em relação aos tempos anárquicos e sem controle do "Futebol das Antiga". Esses torcedores dizem que vivemos como marionetes do sistema e os times marionetes de grandes empresários, enquanto assistimos os jogos. Faz sentido, mas será que vivemos mesmo? E antigamente era diferente? É clara a manipulação do social e econômica por meio do esporte, mas isso não é coisa nova e todos sabemos (vide Copa de 70 e todas mãozadas que Corinthians e Flamengo já deram em decisões). Além disso, entramos na contradição maior desses torcedores saudosistas: em tempos anárquicos seus times roubavam e subornavam, e eram roubados e subornados, para cima e pra baixo, e mesmo assim existe essa visão romântica de que o futebol era jogado melhor e era mais puro. Sendo bem pessimistas, é provável somos e sempre seremos marionetes do sistema capitalista, até os que se dizem visionários e lutam contra ele. Mas qual a saída então?

Pós-modernidade

O Sonho do Futebol Pós-Moderno

Ao nosso ver, são necessárias quatro ações para melhorar o "Futebol Moderno" ao ponto da melhora ser inegável. Sempre existirão saudosistas e nostálgicos e sempre existirão grandes empresários e empresas (será?) se houver lucro no esporte. Infelizmente, somos humanos e somos o que somos. As quatro ações que concluímos com esse texto são:

1 - Regulamentação da mídia e dos investimentos dos clubes: um 50+1 da Bundesliga adaptado à brasileira unido a uma regulamentação da mídia (parecida com a que foi proposta por Haddad na última eleição) que dividiria as concessões de mando de campo e de transmissão para times menores e canais menores. O que ocorre ao nosso ver é que pequenos canais e pequenos times não possuem possibilidade de competição e investimentos iniciais, visto que não tem torcedores e não tem torcedores pois não possuem tempo de transmissão em canais locais. É um ciclo - o patrocinador não quer patrocinar o time pois ninguém vê a blusa - se o time não tem patrocinador o time não tem dinheiro - se o time não tem dinheiro o time não ganha - se o time não ganha o time não tem torcedor. É uma coisa impossível de se imaginar hoje em dia, mas quem sabe no futuro. Resta pressionar a CBF e votar melhor nas eleições para que o governo não deixe que a Globo compre tudo quanto é direito à venda e para passar pra Band simplesmente para outros canais não poderem comprar.

2 - Contato mais direto entre torcedor e clube: após a primeira ação, a segunda será mais fácil de ser cumprida. É necessária a valorização dos torcedores locais e antigos e ao mesmo tempo um contato com o mundo globalizado. A descentralização centralizadora dos times e torcedores. A globalização é vantajosa para os clubes e bonita de se ver quando se trata de um xadrezista russo com a blusa do Neymar, mas é desvantajosa quando o clube se esquece de quem enche seus estádios todo dia de jogo. É necessário pressionar os clubes para que olhem ao mesmo tempo para fora e para dentro para que os clubes não percam suas raízes e ao mesmo tempo possam crescer como uma árvore majestosa. Apesar de árvores não poderem voar, é possível que os torcedores associados há muitos anos paguem menos por ingressos e blusas, algo do tipo.

3 - Valorização do futebol feminino: precisamos de valorizar mais o futebol feminino, pois com mais torcedores, virão mais patrocínios, e com mais patrocínios mais times, com mais times mais jogadoras, com mais jogadoras mais competição, com mais competição melhor futebol. A crítica constante ao futebol feminino é que tem um tom desengonçado, lento e mal jogado, parece muito com o futebol das antiga poderiam dizer. Dizemos: talvez o futebol feminino seja a real vacina necessária para que o futebol volte a ter esse sentimento de fidelidade e honestidade, como era antigamente, e ao mesmo tempo seja algo globalizado. Por estar ainda em um estágio "inicial" (apesar das mulheres jogarem futebol há muitos e muitos anos), o futebol feminino e suas competições estão afastadas das grandes garras maldosas do capitalismo e dos grandes empresários, por enquanto. Tomara que elas acertem onde nós homens, erramos. Mas para o futebol feminino crescer ele precisa de torcedores reais.

4 - Resolver essa porra dessa história desse VAR do caralho: desculpa o palavreado mas é isso mesmo, não somos contra o VAR mas é necessária uma regulamentação clara e objetiva, algo adaptado do que acontece nos esportes americanos ou no tênis e no vôlei por exemplo. O problema da regulamentação atual do VAR é que ela só traz desvantagens. A primeira é que o jogo para durante muito tempo e perde seu ritmo, graças aos vídeos estarem numa salinha na puta que pariu e quem assiste os vídeos não terem contato direto com juízes e bandeirinhas ali no campo. A segunda é que apesar dos jogadores não poderem pedir o VAR, toda hora eles enchem o saco pedindo o VAR e isso para o jogo mais ainda. A terceira é que a decisão no final das contas ainda é de um juiz só e ele ainda comete os mesmos erros, independente de ter um monte de lunático assistindo o lance em um monte de tela numa salinha escura na puta que pariu. Se a regulamentação fosse mais simples, mais clara e mais objetiva resolveria tudo. Um exemplo seria o de que o time pode pedir dois VAR por jogo e apenas isso (o que acontece com substituições, ninguém fica pedindo uma substituição a mais não, tem o número e acabou), o jogo não ia parar durante tanto tempo e o povo não ia ficar enchendo o raio do saco. Outro exemplo seria colocar os vídeos em campo mesmo para árbitros e bandeirinhas unidos pudessem eles mesmo tirar as conclusões, e não numa sala lá na puta que pariu pra depois mandar pra um cara só decidir. Outro exemplo seria deixar a jogada acabar para depois olhar a porra do troço, ao invés de apitar e já ir olhando. Enfim, dá pra fazer muita coisa, mas todos sabemos que a maneira como está não dá.

Conclusão

O futebol moderno é melhor que o das antiga, sim. Chorem o quanto quiserem. A sociedade caminhou pra frente e o futebol também, aceitem. Mas existem coisas positivas no futebol antigo que vale a pena serem reinstituídas, como a valorização do torcedor como pessoa e o contato direto entre clube e fãs. O futebol moderno tem de melhorar muito ainda pra virar o futebol pós-moderno bom de verdade e estar acima de qualquer crítica. Até lá, nos resta lutar para que cada vez fique melhor esse esporte do capeta. Se alguém vier falando sobre futebol moderno mande esse texto para ele.

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

As guerras esquecidas


 Nemanja Matic, à esquerda

Os conflitos da Primeira Guerra Mundial acabaram exatos cem anos atrás, no dia 11 de novembro de 1918, com a assinatura do Armistício de Compiègne pelos Aliados e pela Alemanha. O documento oficializava o fim do combate na terra, no mar e no ar. Com isso, desde 1921 os cidadãos dos territórios britânicos usam os “poppies” – um broche vermelho em forma de papoula – pra honrar os membros das forças armadas que morreram em serviço, número que ultrapassa um milhão. Em todos os anos, desde então, a homenagem se prolonga por dias durante o mês de novembro, até o Remembrance Day, que em 2018 foi um domingo.

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Quando o vilarejo sérvio de Vrelo foi bombardeado em 1999, numa ofensiva da OTAN pra expulsar forças sérvias do Kosovo, Nemanja Matic tinha 12 anos. Esse foi um dos episódios da Guerra Civil Iugoslava, uma sequência de conflitos armados que aconteceram na antiga Iugoslávia, cujo objetivo, entre outros, era a formação de um estado sérvio. Quase todos os crimes de guerra foram cometidos, como limpeza étnica, crimes contra a humanidade e estupro. O Reino Unido é membro da OTAN desde 1949.

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Quando James McClean era um garoto em Derry, Irlanda do Norte, também por volta de 1999, ele ouvia histórias sobre as seis pessoas que viviam no seu bairro e haviam sido mortas no Domingo Sangrento, em 30 de janeiro de 1972, aquele mesmo de "Sunday Bloody Sunday", do U2. Nesse dia, o Exército Inglês atirou em católicos e protestantes desarmados que manifestavam contra a mania do Governo Britânico de prender cidadãos suspeitos de terrorismo sem julgamento e contra as diferenças religiosas em seu país. Catorze pessoas morreram. A Irlanda do Norte faz parte do Reino Unido desde 1921, quando foi fundado o estado após a separação do que se tornaria a República da Irlanda.

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Nos últimos anos, as ligas profissionais inglesas de futebol adotaram o uso dos poppies no uniforme dos clubes pra lembrar os mortos, mas não sem causar constrangimento entre os jogadores que discordam da prática. Matic, do Manchester United, e McClean, do Stoke City, não usam o broche e tiveram de se justificar publicamente depois de repreensão pela imprensa e ameaças por parte dos torcedores dos próprios clubes em que jogam. Com os motivos explícitos revelados pelos atletas, fica implícito que eles enxergam no poppy a desapropriação de um ato genuíno por políticos britânicos do presente que impulsionaram guerras no Afeganistão, no Iraque ou na Síria, por exemplo. Antes disso, óbvio, estão as experiências dos dois jogadores, que viram de frente o gosto por guerra do país que criou o futebol.
 
James McClean, à esquerda

Matic e McClean não falharam em prestar respeito aos mortos da Primeira Guerra mesmo sem usar o poppy. Do outro lado, o Reino Unido também não falhou em violar o direito à vida desses jogadores e de tantos outros sérvios, irlandeses e cidadãos de outras nações ao longo dos últimos cem anos. Quando o apocalipse se torna prioridade e é guerra o que se deseja, é preciso encarar as consequências e não as deixar pra caridade ou homenagens póstumas. Não existe lado certo na guerra, mas nos tempos de paz também é necessário lembrar dos mortos no outro lado da trincheira.

Aqui no Brasil, domingo foi dia de prova II do Enem e nenhum brasileiro recebeu homenagem por ter morrido na Primeira Guerra. Eu, que não tenho nada que ver guerras mundiais e Reino Unido, não usei o poppy. Eu não gosto de guerra nem de forças armadas, mas gosto de futebol e de U2. Nunca duvidei da força social que move esse esporte e acredito que ele seja lugar pra expressão de todos os pontos de vista que interessem às comunidades local e global.

Na Inglaterra, o grito silencioso de dois jogadores – que não foram os únicos – foi ouvido de longe e incomodou. Incomodou porque guerras esquecidas foram lembradas a uma nação cujo patriotismo exacerbado promoveu a separação do resto da Europa, o que faz com que eu me pergunte quando vão lançar o broche em homenagem à sensatez soberana britânica.

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Matic entrou em campo nesse domingo, e seu time perdeu o clássico de Manchester por 3 a 1. O Stoke City de McClean jogou sábado contra o Nottingham Forest e não saiu do 0 a 0. Mais uma vez eles não usaram o broche.


quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Os Daronquinho

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ESCLARECIMENTO

DARONQUINHO (do grego vulgar Daronco + -inho, in "brasilian affective diminutives")
          Da-ron-qui-nho: Subs. Masc. Sing.

         Aquele que, em certames e jogos, faz cumprir as regras estabelecidas; árbitro, julgador; juíz. Autoridade máxima dos preceitos da moral e ordem.

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Daronquinho 1

Antes de mais nada, vamos esclarecer uma coisa: consultei um especialista nas linguagens das ruas paulistas, o internacional Tiago Baccarin, primo da Morena Baccarin e faixa-preta em significados informais das palavras portuguesas na internet, só para trazer essa novidade. O hodierno termo vem suprir a necessidade de nomear aqueles juízes que por vezes ou parecem não dominarem totalmente as determinadas normas existentes no desporto ou então dominam muito mais do que nos deixam saber as "regras do jogo". Isto é, esclareço ainda mais, tomam algumas decisões, naqueles calorentos momentos, minimamente questionáveis, o que nos faz pensar que talvez as "regras do jogo" sejam um pouco diferentes daquelas documentadas em papéis. 

De acordo com o nosso especialista, o termo Daronquinho deriva de um monstro da arbitragem, Anderson Daronco, cujo os braços são maiores que seu currículo. Até onde consta, pelo viés popular, a nova palavra acabou se desvinculando de sua origem, tornando-se singular. Apesar disso, ainda é um excelente objeto ilustrativo para se pensar o papel dos Daronquinho nos vários jogos de diferentes níveis disputados nesse Brasilzão de Deus. Como o nosso blog é totalmente imparcial, não poderíamos afirmar, por exemplo, todo o "amor" que os palmeirenses nutrem pelo Daronco original, afinal foi ele quem em várias ocasiões prejudicou o verdão, hoje líder do Assaí. Também não podemos afirmar ser bastante questionável a inalienação seletiva de determinados juízes por aí ao condenarem alguns e caucionarem outros. Afirmaremos, todavia, que estaremos discutindo somente, e tão somente só, as ações de Daronquinho que, no limiar da verdade, transpassam algumas de suas motivações ou incapacidades de arbitragem no decorrer de suas ações. 

E não é de se espantar que quando presenciamos as ações dos juízes tomemos, por nós, certos juízos. Obviamente que tais juízos jamais seguirão totalmente desconectados da realidade, e mesmo que não sejamos inteiramente capacitados, nossos julgamentos se aproximam do que nos ensinam as regras existentes e fundamentadas, os indivíduos discricionários dotados de poderes e, para não dizerem que não sou de humanas, uma porcentagem mínima de uma praxe subjetiva e pessoal. Assim se salvaguarda o direito a sistematização de eventos populares, como o esporte, e a tentativa de se organizar essa festa, já afirmada aqui em outra oportunidade, emanada pela democratização e carnavalização popular. Salvaguarda-se também o ingrato papel da arbitragem nessas várias festas, visto que o caráter burocrático tende a diminuir diferentes pesos que porventura podem ser aplicados a uma só medida. Entretanto, é importante elucidar que há igualmente o salvaguardamento do direito ao questionamento desses poderes, pelo princípio básico de cada um que é a tentativa... Repito, a tentativa de se aperfeiçoar e minimizar injustiças. Todavia, há injustiças. E por mais que o texto sirva mais como uma evidenciação anedótica que propriamente como um discurso fundamentalmente científico, ainda assim há injustiças praticadas por injustos em posição de juízo que precisam ser discutidas. Nesse sentido, lanço mão à pergunta: quem julga os julgadores?

Daronquinho 2

A bola da vez para ser discutida é o Inter. Nessa trigésima segunda rodada do brasileirão alguns argumentaram que o colorado sagrou-se vencedor por 2 a 1 na partida contra o Atlético Paranaense por interferência direta do juiz, mas não o juiz da foto, que é o Igor Junior Benevenuto, mas do juíz Rodrigo Ferreira. Na partida contra o Furacão, o Daronquinho Ferreira chamou a responsabilidade para si ao marcar alguma coisa sobre Rossi na entrada da área. Eu sei que existem algumas discussões relacionadas no Brasil recentemente sobre "pós-verdades" e qual a melhor maneira de se lidar com tanto erro de leitura cometidos por brasileiros, porém no lance a gente verifica perfeitamente que não foi pênalti. Tudo bem, na realidade tudo acontece muito rápido e muito bagunçado, e às vezes essas figuras de arbitragem se guiam mais pelos instintos que propriamente por toda a racionalidade de um replay. Pois bem, na trigésima primeira rodada do Assaí, uma antes dessa polêmica, o Inter se envolveu numa outra polêmica acerca de pênaltis, só que dessa vez contra o Vasco e dessa vez contra a si. A partida foi incendiada por Kelvin que, aos 44 do segundo tempo, tentou invadir a área e foi supostamente derrubado por dois jogadores colorados. Verdade seja dita, o Daronquinho Benevenuto apenas acatou a marcação daquele encostado que fica sentado ao lado do gol, e marcou um pênalti não existente, o que concedeu a Maxi Lopez a oportunidade de empatar a partida em 1 a 1. Na trigésima rodada, mais uma vez o Inter, agora sem pênalti, viu um de seus gols anulado no empate por 2 a 2 contra o Santos, num lance em que, após uma divisão entre Cuesta e Sánchez, a bola sobrou para Leandro Damião que numa rara oportunidade fez um belíssimo gol. Anulado. Coitado do Damião, nunca faz gol, e quando faz tem lá um Daronquinho pra atrapalhar. 

Recentemente o presidente do Internacional encabeçou uma iniciativa. Com apoio inicial de 14 clubes da série A do brasileirão, o intuito era aplicar ao campeonato a utilização do famigerado VAR nos restantes jogos da competição. Mais tarde, quatro outro clubes juntaram-se ao manifesto (apenas o Vasco se omitiu, e o Atlético Mineiro, até onde saiba, apoiou, porém com ressalvas). O pedido foi negado, afinal não adiantaria ter esse tipo de iniciativa ainda nesse campeonato. Em entrevista após o último jogo contra o Furacão, Marcelo Medeiros comentou sobre o mais recente erro dos Daronquinho. E não tem muito para comentar sobre isso, já que se fossemos continuar a contagem de erros a favor ou contra qualquer equipe brasileira em competições nacionais ou internacionais ficaríamos apontando em quase todas as partidas os mesmos "erros capitais". A imagem que fica é que as justiças feitas assemelham-se muito mais a injustiças recorrentes, travestidas de exceções num balanceamento e nivelamento pelo "regular". Por fim, fica evidente o comentário do Coronel "Daronquinho" Marinho, presidente da Comissão de Arbitragem da CBF, que disse que se fossemos balancear os acertos e erros estaríamos em saldo positivo. Em entrevista ao Sportv no dia 24 de outubro, a avaliação pelo Coronel Daronquinho sobre a arbitragem foi "bom". Muito sucinto.

Daronquinho 3


Acredito que tenha sido Walter Benjamin que afirmou em sua vasta bibliografia ser a realidade composta de inúmeras injustiças, a grande maioria delas sem possíveis remediações, e sendo, não obstante, a maior dessas injustiças a nossa eventual apatia frente ao estado de absurdo da realidade. Temos o direito, como foi dito, de manifestarmos e apontarmos as injustiças. Pois, apesar de gritarmos aos ventos,  gritamos com a segurança de não estarmos apáticos e pecadores do maior dos pecados. E mesmo que as instituições sistematicamente burocráticas existam para moderarem a ocorrência de um maior número de injustiças comparadas àquelas já ocorrentes, ainda assim são passíveis de críticas, por mais levianas que sejam, tal como esse texto. A própria figura de autoridade por si é contraditória, uma vez que ela busca minimizar, senão acabar, com as contradições de seu campo. Como falei, é ingrato o papel de árbitro... O d'Os Daronquinho, nem tanto. O papel dos Daronquinho é servir de exemplo elucidativo da incapacidade de se ajustar totalmente a sociedade ou manifestações sociais a um tipo de comportamento inteiramente moralista e ordenado. O papel dos Daronquinho é fazer a gente ver que um dia um time ganha, noutro o time perde, por vezes com interferências externas, e tudo que podemos fazer é aguentar e seguir em frente, porque amanhã pode ser a nossa vez de sermos beneficiados em detrimento de se prejudicar outro alguém. O papel dos Daronquinho é afirmar o caixa 2 como um dos piores crimes democráticos e depois afirmar que está tudo bem o Ônix Lorenzoli ser possível ministro, já que ele se desculpou, e não ter problema nenhum em aparentar estranheza quanto a sua tendência pessoal.

No jogo das comparações, talvez seja ingrato, da minha parte, julgar essas figuras de autoridade do conforto da minha casa sentado na minha cadeira de plástico escrevendo no meu blog amado. Talvez esse não seja o meu papel, o de julgar os julgadores. Mas de uma coisa eu tenho certeza, é meu papel colocar os Daronquinho com erro de concordância em todo o texto, porque se eles não concordam entre si lá fora, não sou eu quem vai fazê-los concordarem aqui dentro. 



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Fica registrado meu apoio ao Paraná, matematicamente rebaixo. Força, consagrados!
Fica registrado também meus agradecimentos ao Tiago Baccarin, o primo que, com muito senso de humor, concordou aparecer nesse blog. Muito obrigado.